quarta-feira, 3 de março de 2010

J. C. Ryle (1816-1900): Notas sobre João 1:29

[do mundo] É quase desnecessário dizer que há duas visões dessa expressão.

Alguns dizem que ela somente significa que Cristo tira o pecado dos gentios assim como dos judeus, e que ela não significa o pecado de todos, mas dos eleitos.

Outros dizem que ela realmente significa que Cristo “tira” o pecado de toda humanidade, isto é, que Ele fez uma expiação suficiente para todos, e que todos são salváveis, mas nem todos são salvos, em conseqüência de Sua morte.

Eu decididamente prefiro a última dessas duas visões. Eu defendo tão fortemente quanto qualquer um, que a morte de Cristo é aproveitável para ninguém, a não ser os eleitos que crêem em Seu nome. Mas eu não me atrevo a limitar e reduzir tal expressão como essa diante de nós.

Eu não me atrevo a dizer que nenhuma expiação tem sido feita, em nenhum sentido, exceto para os eleitos. Eu creio que é possível ser mais sistemático do que a Bíblia em nossas declarações. Quando eu leio que os ímpios que estão perdidos “negaram o Senhor que os comprou” (2 Pedro 2:1), e que “Deus Deus em Cristo estava reconciliando o mundo consigo” (2 Cor 5:19), eu não me atrevo a confinar a intenção da redenção aos santos somente. Cristo é para cada homem.


Eu estou ciente de que a objeção é frequentemente feita, que “se Cristo tirou os pecados do mundo, e ainda assim a vasta maioria dos homens morrem em seus pecados e estão perdidos, a obra de Cristo por muitos foi feita em vão”. Eu não vejo força nessa objeção. Eu penso que nós podemos assim também argumentar que, como o pecado entrou no mundo e estragou a criação, a criação, então, foi em vão. Nós não estamos falando da obra de homens, mas da Palavra Eterna, e nós devemos estar contentes em ver tanto em Suas obras que não compreendemos inteiramente. Apesar de multidões estarem perdidas, eu não tenho dúvida de que o último dia provará que nada que Cristo fez por eles foi em vão.

Eu apóio minha visão do texto, que de alguma inefável e inescrutável maneira, todo o pecado do mundo foi tomado e expiado por Cristo. “Ele tirou, ou fez expiação dos pecados de todos os homens e de todas as mulheres no mundo.”. Eu não tenho dúvida, da Escritura, que a vasta maioria dos habitantes “do mundo” serão achados no passado não tendo recebido beneficio de Cristo, e tendo morrido em seus pecados.

Eu repudio a idéia de salvação universal, como uma perigosa heresia, e totalmente contrária as Escrituras – Mas os perdidos não provarão ser perdidos porque Cristo nada fez por eles. Ele tomou sobre si os seus pecados, Ele carregou suas transgressões, Ele proveu o pagamento, mas eles não colocaram em seu clamor qualquer interesse nisso. Ele deixou a porta da prisão aberta para todos; mas a maioria não vai para fora  para ser livre. - Na obra do Pai na eleição, e do Espirito na conversão, eu vejo muito claramente, na Bíblia, limitações. Mas na obra de Cristo na expiação eu não vejo limitações. A expiação foi feita por todo o mundo, mas é aplicada e desfrutada por ninguém a não ser os crentes. - A intercessão de Cristo é o peculiar privilégio de Seu povo. Mas a expiação de Cristo é um beneficio que é oferecido livremente e honestamente a toda humanidade.

Ao dizer tudo isso eu estou completamente ciente de que a palavra “mundo” é algumas vezes usado em um sentido qualitativo, e deve ser interpretada com algumas limitações Quando é dito “o mundo não me conheceu” (João 1:10), não pode significar que nenhuma pessoa no mundo o conheça. Mas no texto diante de nós eu não vejo necessidade para limitações. Eu vejo toda a massa de culpa da humanidade reunida em uma única palavra “o pecado do mundo”, e este pecado, eu estou dizendo, Cristo “tira”. Eu creio que o verdadeiro sentido é, que o Cordeiro de Deus fez expiação suficiente para toda humanidade, mas eficiente inqüestionavelmente por ninguém a não ser os eleitos.

Agostinho observa “Quão pesado deve ser o sangue do Cordeiro, por quem o mundo foi feito, para virar a balança quando pesado contra o mundo!”

Calvino em seu comentário desse verso, diz “João usa a palavra pecado no singular para qualquer tipo de iniqüidade; como se ele tivesse dito que cada tipo de injustiça, que alienava os homens de Deus, é tirada por Cristo. E quando ele diz “O pecado do mundo”, ele estende esse favor indiscriminadamente a toda raça humana, para que os judeus não pudessem pensar que Ele tinha sido enviado somente para eles. Por isso nós inferimos que todo o mundo é envolvido na mesma condenação, e que como todos os homens, sem exceção, são culpados de injustiça diante de Deus, eles precisam ser reconciliados com Ele. João, o Batista, por falar de uma forma geral do pecado do mundo, intencionava gravar sobre nós a convicção de nossa própria miséria, e nos exortar a buscar o remédio. Agora nosso dever é abraçar o beneficio que é oferecido a todos, que cada um de nós possa ser convencido de que nada o impede de obter reconciliação em Cristo, desde que venha a Ele guiado pela fé.

Brentius diz “Apesar de todos os homens no mundo não receberem o beneficio da paixão de Cristo, porque nem todos crêem em Cristo, ainda assim o beneficio é oferecido a todo o mundo, para que todo aquele, quer circunciso quer incircunciso, rei ou plebeu, alto ou baixo, rico ou pobre, doente ou saudável, velho ou jovem, que receba a Cristo pela fé, seja justificado diante de Deus, e salvo com uma eterna salvação.”

Musculus diz “João não coloca diante de nós uma pessoa em particular cujos pecados o Cordeiro veio para tirar; mas sobre a expressão “o mundo” ele compreende toda a raça de mortais do inicio do mundo até o final”

Melancthon diz “Ele tirou o pecado, isto é, a eterna condenação da raça humana”.

Chemnitius diz “ João afirma que os benefícios de Cristo não dizem respeito somente aos judeus, mas ao mundo todo, e que ninguém que está no mundo é excluído dele, se somente quiser receber ele pela fé”.


O profundo conhecimento espiritual exibido por João, o Batista, neste verso, não deve ser neglicenciado. Tal sentença como essa diante de nós nunca saiu dos lábios de qualquer outro discípulo de Cristo antes do dia de Pentecostes. Outros puderam dizer que nosso Senhor era o Cristo, o Filho de Deus, o Messias, o Filho de Davi, o Rei de Israel, o Filho do Bendito, que estava vindo para dentro do mundo. Mas nenhum pareceu ter visto tão claramente como João que Cristo era o sacrifício pelos pecados, o Cordeiro de Deus que estava para ser morto. Bom seria para a Igreja de Cristo no século dezenove, se todos os ministros possuíssem tanto conhecimento da expiação de Cristo como é aqui demonstrado por João, o Batista! João viu o sacrifício vicário de Cristo, antes Dele morrer na cruz. Muitos assim chamados cristãos não podem ver o sacrifício vicário de Cristo mesmo neste dia!





Fonte: J. C. Ryle, Expository Thoughts on the Gospels,
download: http://www.tracts.ukgo.com/ryle_gospel_of_john.htm

Tradutor:   Emerson Campos Pinheiro.   Ao utilizar esse texto devem ser citados a fonte e o tradutor.