Meu primeiro argumento é que a expiação limitada é incongruente com a representação federal e imputação forense. Essas duas doutrinas são centrais para a substituição penal, a qual, por sua vez, é o coração da expiação.
Elas dizem, primeiramente, que um homem pode representar outro de forma que mesmo seus pecados ou justiça podem ser considerados como do outro; e, em segundo lugar, que Deus, de fato, imputa nossos pecados em Cristo e Sua justiça em nós, pelo qual nós podemos ser salvos aparte de qualquer mérito de nós mesmos – porque nós não temos nenhum.
Elas dizem, primeiramente, que um homem pode representar outro de forma que mesmo seus pecados ou justiça podem ser considerados como do outro; e, em segundo lugar, que Deus, de fato, imputa nossos pecados em Cristo e Sua justiça em nós, pelo qual nós podemos ser salvos aparte de qualquer mérito de nós mesmos – porque nós não temos nenhum.
O Mecanismo da Imputação
Considerando como a imputação funciona, certas conclusões se apresentam em minha mente, as quais contradizem a expiação particular.
Imputação em nós
Cristo tendo cumprido toda a lei, é contado como justo, e sua justiça é imputada a nós por Deus. Mas qual é a forma dessa justiça? Não me parece que possa ser na forma de atos específicos, porque isto resultaria em óbvios absurdos. Por exemplo, suponha que eu pergunte: Cristo cumpriu toda a lei no sentido de guardar cada singular mandamento dado? Naturalmente Ele guardou cada mandamento que se aplicava a Ele – mas e se Ele nunca tivesse encontrado o jumento perdido de seu inimigo, a fim de reconduzi-lo (Êxodo 23:4)? Isso implica que sua adesão a lei era menos que perfeita? Isso implica que sua justiça, imputada a mim, é de alguma maneira deficiente? Isso implica que, se eu fosse um judeu antes da minha conversão e tivesse encontrado o jumento do meu inimigo e o tivesse reconduzido, isso seria adicionado à Sua justiça imputada a mim?
A resposta para essas questões não devem ser claras. Deus não vê a lei dessa maneira; como se, em Cristo, eu estivesse sendo contado como tendo feito exatamente os atos que Ele fez, e nenhum outro. Não são os atos de Jesus que são imputados em mim, mas a justiça fundamentada nesses atos. Por isso “aquele que ama o outro tem cumprido a lei” (Romanos 13:8), e como Cristo amou perfeitamente, eu estou contado como tendo amado perfeitamente, e assim como tendo cumprido toda a lei. Portanto, eu concluo que a justiça imputada em mim é qualitativa, e não quantitativa. Não é uma série de atos de justiça que são imputados – é a justiça em si mesma. Isso é, a condição de ser justo, a qual é o fundamento desses atos.
O pecado herdado, parece funcionar da mesma maneira. Não é a ação de Adão, o especifico pecado de comer o fruto, que é imputado a mim; é a culpa em si. Ou seja, é a condição de ser desobediente, a qual é o fundamento de comer o fruto, que é imputada. Ou, colocando de outra maneira, eu sou um pecador em Adão – não em comer um fruto.
Imputação em Cristo
Agora, me parece muito razoável pensar que há uma simetria entre a imputação em nós, e a imputação em Cristo. Qualquer um é bem-vindo para argumentar de outra maneira nos comentários a seguir – mas tais argumentos devem oferecer boas razões para disparidade. Eles não podem apenas ser assertivos; nem dizer que deve ser assim sobre a base da expiação particular, uma vez que isso meramente ignoraria a questão tomando-a como certa contra mim. Sem qualquer evidente razão para o contrário, eu tomo como dada que imputação é imputação – se ela funciona de uma certa maneira para nós, deve funcionar da mesma maneira para Cristo.
Conseqüentemente, apesar de parecer que muitos cristãos reformados assumem que são nossos atos de pecado específicos que são imputados em Jesus, esse não pode ser o caso. Ao invés, o que é imputado é nossa qualitativa condição de pecadores. Isso é certamente o que 2 Corintios 5:21 e Gálatas 3:13 dizem: que por nossa causa Deus o fez pecado (singular), de forma que Ele tornou-se uma maldição (singular), para que Nele nós pudéssemos ser justiça (singular) de Deus. E isso não é congruente com João, que diz que Jesus tira o pecado (singular) do mundo? Todos esses termos sugerem uma global, condição qualitativa, ao invés de uma específicos atos quantitativos.
Isso é porque (com o risco de fazer isso parecer simples) culpa é culpa, e justiça é justiça. Você ou é justo ou é culpado, “Porque qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos. Porque aquele que disse: Não cometerás adultério, também disse: Não matarás. Se tu pois não cometeres adultério, mas matares, estás feito transgressor da lei.” (Tiago 2:10-11). A Lei é singular, indivisível especificação de obediência. Esse principio de obediência é manifesto em vários artigos da lei, de forma que quebrar um deles é quebrar toda a lei – e quebrar toda a lei é desobediência e ser culpado. Aqui pode haver um aspecto qualitativo e um aspecto quantitativo de meus pecados em termos de artigos da Lei – isto é, eu quebro um certo número de leis um certo número de vezes (quantidade), e em cada ocasião com uma certa severidade (qualidade). Mas em termos da Lei, ou eu sou obediente – ou eu não sou.
Com isso em mente, é evidente para mim que quando a substituição penal é concebida, é obediência ou desobediência, justiça ou culpa, a qual esta sendo substituída. Não são atos individuais de obediência ou desobediência, justiça ou culpa.
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Um pouco de explicação adicional
Assim minha tese é que a imputação é a legal transferência somente de uma condição ou de uma qualidade. Com relação a justiça, isso significa que eu sou considerado como obediente, como um guardador da lei, e sem pecado. O fundamento para ser assim considerado é a representação federal de Cristo, que realmente foi sem pecado em sua vida pessoal. Mas não é a vida pessoal a qual é contada como minha; ao invés, é a obediência dessa vida. Por outro lado, com relação ao pecado, imputação significa que Cristo foi considerado como desobediente, como um quebrador da lei, um pecador.
O fundamento para ser assim considerado são as pessoas que Ele representa federalmente, que realmente foram, são e serão pecadores em suas vidas pessoais. Mas novamente – não são suas vidas pessoais que são contadas como sendo Dele, e nem seus pecados pessoais; ao invés, é a desobediência dessas vidas. Portanto, mesmo se fosse somente os eleitos cujos pecados tivessem sido o fundamento da imputação (uma noção a qual eu sou simpático), permanece que o escopo da expiação é ilimitada ou universal, uma vez que pecados individuais não fizeram parte da equação. Foi a condição de ser um pecador a qual foi imputada a Ele – e assim Ele representou todo e qualquer pecador pelo mérito de compartilhar de sua humanidade.
Essa é uma visão a qual pode ser chamada expiação judicial, a qual vê o pagamento dos pecados como penal, a ser pago em nossas próprias pessoas – com a morte. É oposta a expiação pecuniária, a qual vê o pagamento dos pecados como uma transação, como o pagamento de um montante de dinheiro. Como Steve Costley coloca “Cristo não tem pago um determinado montante por determinados pecados. Seu sangue não é como uma quantia de dinheiro. Seu sofrimento não é um pagamento dor por dor equivalente ao sofrimento devido a nós.”
Se isso é assim, então é sem sentido pensar que a expiação é particular ou limitada em escopo. Particularidade requer uma visão pecuniária na qual específicos pecados e não outros foram imputados a Cristo. Eu penso que essa visão é falha, e que quando a Escritura compara a expiação ao pagamento de um resgate, essa metáfora não deve ser tomada literalmente. Não é o caso que certas pessoas foram excluídas de serem representadas federalmente na cruz. Apesar de Cristo poder ter tido os eleitos especificamente em vista quando morreu, sabendo que sua morte era intencionada a ser eficaz somente por eles, ainda seria o caso, na prática, Dele ter representado toda a humanidade – porque Ele, em si mesmo, foi um ser humano. Assim sua expiação pode ser feita eficaz mesmo para os réprobos, desde que eles voltem (se arrependam) e vivam.
Uma dupla de observações de suporte
O fato da morte de Cristo
Um dos aspectos particulares da expiação, a qual eu penso suportar minha visão, é que a maneira pela qual Cristo pagou a penalidade pelos pecados. Seu pagamento não foi a mesma penalidade a qual eu mesmo deveria pagar, fosse eu morto em incredulidade. Para mim, o eterno sofrimento em um local físico chamado inferno seria a justa e necessária conseqüência de minha desobediência a Deus. Jesus, no entanto, não sofreu em um local físico chamado inferno depois de sua morte – nem mesmo por um curto período de tempo. Ele foi “naquele dia” para o lado de seu Pai (Lucas 23:43). De fato, somente a óbvia similaridade entre as ações de Cristo que expiaram meu pecado, e as ações as quais eu mesmo deveria expiar, é a morte.
Isso é inteiramente congruente com a Escritura, porque “o salário do pecado é a morte” (Romanos 6:23). Isto é, o salário de todo e qualquer pecado é a morte. Agora, a morte de um pecador não regenerado é um imperfeito salário – não pode nem tirar a culpa, nem reconciliar o pecador com Deus. Assim, inferno. Mas Deus sendo perfeito em si mesmo, a morte de Cristo é um perfeito salário – foi uma perfeita propiciação da culpa da transgressão de toda a Lei, e pode reconciliar qualquer um com Deus, porque Cristo é Deus. Dessa forma, qualquer pecado que eu tenha cometido, seu pagamento foi coberto em extremo em Cristo (Hebreus 7:25) se ele é contado como um transgressor em meu lugar.
O evento real da imputação
Agora, essa expiação deve ser aplicada em mim a fim de que eu seja contado como justo. Isto é, em algum ponto do tempo meu pecados devem ser imputados a Cristo, de outra maneira eu não seria salvo. Sobre a visão pecuniária, Cristo pagou por meus pecados na cruz. Sendo assim, Deus sempre me contar como um transgressor parece injusto. Se meus pecados foram cobertos em Cristo desde antes de eu nascer, então não houve um tempo em minha vida quando eu devesse a penalidade a Ele. Desde minha concepção, eu teria estado em Cristo. Mas eu sei que se alguém está em Cristo ele é uma nova criatura (2 Corintios 5:17). E certamente, eu sei que eu sou agora uma nova criatura – uma pessoa espiritual, ao invés de alguém natural (1 Corintios 2:6), e estou reconciliado com Deus – porque eu me lembro de um tempo anterior no qual eu era um “filho da ira” (Efésios 2:3), e em um ponto do tempo quando eu fui reconciliado com Deus por meio de Espírito, pela fé (Romanos 5:1).
Para ser justo, há uma distinção entre a imputação de meus pecados em Cristo, e de sua retidão em mim. Muitos cristãos concordam que é somente no evento do último, quando eu obtenho a fé, que eu deixo de estar sobre a ira de Deus. No entanto, eu acho difícil ver como eu posso justamente estar debaixo da ira de Deus desde meu nascimento. Se meu pecado está pago, então ele está pago, e a ira de Deus não mais permanece sobre mim. Portanto, eu concluo que a aplicação da expiação...pode não ter ocorrido na cruz. A morte de Cristo foi realmente representativa, e é sustentada como um objeto de salvação. Eu sou contado como sendo representado por Ele na ocasião de minha fé nesse objeto. Isso, por sua vez, se alinha bem com a maneira pela qual a serpente de bronze de Números 21 funcionou. Como um tipo da expiação de Cristo, ela se encaixa perfeitamente com a visão judicial – mas não é congruente com a visão pecuniária.
Essas parecem para mim as considerações mais importantes com relação a representação federal e imputação. Eles todos parecem apontar para uma expiação judicial, ao invés de uma expiação pecuniária. É difícil ver como alguns desses elementos são congruentes com a expiação pecuniária – mas eles se encaixam como uma luva dentro da visão judicial.
Fonte: http://bnonn.thinkingmatters.org.nz/on-the-atonement-part-1/
Tradutor: Emerson Campos Pinheiro. Ao utilizar esse texto devem ser citados a fonte e o tradutor.