sexta-feira, 20 de junho de 2014

Terrance L Tiessen: Permissão Divina Arminiana X Permissão Divina Calvinista

Parte 1

Nota introdutória: O texto abaixo faz parte de uma reposta de Terrance L Tiessen a algumas críticas feitas por John Laing, as quais foram direcionadas tanto a ele quanto a Bruce Ware. Sua resposta é representativa e útil em expor com clareza a distinção entre a visão calvinista e arminiana sobre permissão divina. Segue o texto:



Em relação a posição de Ware, Laing, em seguida, faz 2 pontos. Primeiro, ele postula que Ware exagerou as diferenças entre as concepções arminianas e reformadas sobre a questão [da permissão divina], porque Laing acredita que "a maioria dos arminianos poderiam concordar com esta descrição": 

"Deus regula de forma exata o mal que ocorre, uma vez que em relação a todo e qualquer caso de mal, Ele permite especificamente de acordo com a sua sabedoria e propósitos últimos aquilo que Ele poderia ter evitado"(Perspectives, 108; citado p. 24). 

Laing acredita que arminianos poderiam concordar porque:

"A linguagem de permissão e a prerrogativa de Deus para intervir e prevenir qualquer caso de mal são marcas registradas da teologia arminiana ortodoxa. Na verdade, se a governo de Deus do mal só implica a sua permissão e falta de intervenção, então, mesmo a teologia arminiana heterodoxa (por exemplo, teísmo aberto) poderia concordar (p. 24)".

No entanto, eu creio que Laing compreendeu o ponto que Ware estava fazendo, ou seja, que, na perspectiva calvinista, "todo e qualquer caso de mal leva diretamente a uma específico e maior bem para o qual era necessário". Na minha opinião, a compreensão de Laing desse ponto deveria tê-lo impedido de afirmar que os arminianos poderiam concordar com a linguagem de Ware.


Admito que arminianos usam a linguagem da permissão divina e falam da prerrogativa de Deus "para intervir e prevenir qualquer caso de mal." Mas claramente há uma diferença significativa entre o decreto de Deus de permitir específicos eventos ruins para [que ocorram] específicos bens maiores (de acordo com o conceito do calvinismo) e o conceito do arminianismo de uma permissão 
muito geral

Na perspectiva arminiana, Deus permitiu males específicos no sentido em que deu liberdade libertária a criaturas morais, e, assim, voluntariamente limitou Sua capacidade de garantir que todos os detalhes da história do mundo acontecessem como Deus queria que fosse. Deus fez o Seu melhor para fazer acontecer a Sua vontade, mas Ele amarrou suas próprias mãos (falando antropomorficamente, é claro), ao fazer de criaturas morais as determinantes de grande parte do que acontece. Além disso, como já disse várias vezes em postagens anteriores deste blog, eu acho que os sinergistas, incluindo tanto arminianos clássicos quanto teístas abertos, colocam-se exatamente onde eles não querem estar quando eles reclamam contra o calvinismo, afirmando que Deus não tem o direito de intervir e de restringir a liberdade libertária de uma criatura em dada ocasião.

Eu acho que que há uma tensão frequentemente não reconhecida entre as doutrinas de permissão geral e a doutrina da prerrogativa reservada de intervenção. Caracteristicamente, sinergistas afirmam que a providência meticulosa de Deus na teologia calvinista torna Deus responsável pelo mal. Eles removem a si mesmos desse problema ao afirmar que Deus não permite males específicos para específicos bons propósitos, mas que Ele permite que criaturas autenticamente livres façam o mal, apesar de fazer tudo em seu poder para evitar esse mal, através de meios que só não neutralizam a liberdade libertária da criatura. 

Entretanto, admitir que Deus faz isso em algumas, reconhecidamente, raras ocasiões, enfraquece em muito a queixa dos sinergistas contra monergistas. Tome o exemplo do holocausto, como um caso em questão. Deus poderia ter dado a Hitler um ataque cardíaco fatal, mesmo sem restringir a liberdade de qualquer criatura moral. Um arminiano deve explicar por que Deus escolheu não fazer isso, assim como o calvinista. Assim, embora eu pudesse ter falado um pouco diferente do que Ware (assumindo a interpretação de Laing do seu ponto ser correto), eu concordo substancialmente com ele, e eu não acho que Laing ajudou significativamente no caso dos arminianos.


Parte 2 


Eu percebo que Calvino, ao escrever sobre a queda original protestou contra sugerir que Deus "a permitiu". Mas parece-me claro que Calvino estava protestando era contra o tipo de "mera permissão"  encontrada mais tarde na teologia arminiana, onde Deus permite o mal no sentido em que apenas dá uma permissão geral para as criaturas agirem com liberdade libertária a maior parte do tempo, por meio da qual limita a extensão de Seu controle.

Como Calvino, eu enfatizo que quando Deus "permite" o mal, Ele o faz deliberadamente, e Ele poderia ter escolhido não permitir isso, mas teve boas razões para permitir que ele viesse a ocorrer. Este não é o uso arminiano de "permissão divina." No calvinismo, Deus está sempre meticulosamente no controle de tudo o que acontece na história da criação, mas ele não age da mesma forma o tempo todo. Existem coisas que Deus escolhe que aconteçam por sua deliberada "intervenção", incluindo cada ato bom que é feito por uma criatura pecadora, ou seja, cada ato de graça divina. 

Mas há muitos outros casos em que Deus deliberadamente permite que os eventos se desenrolem de acordo com os desejos das criaturas pecadoras, sem o seu "impedimento". Este é o caso sempre que o pecado é cometido. Deus não o impede, mas eu pessoalmente não diria que Ele o "causa". (Na verdade, eu faço pouco ou nenhum uso da linguagem de "causalidade", porque eu acho que ela geralmente não comunica bem o meu entendimento da ação de Deus no mundo. Pode ser um termo válido, mas as pessoas raramente a ouvem da maneira que é intentada tecnicamente).

O que estou sugerindo é que "fraca atualização" é uma forma muito útil para se referir ao que acabo de descrever em relação a deliberada "permissão" de Deus, ou seja, Sua decisão de não evitar algum mal que é feito pelas criaturas. Isso difere então dos casos de "forte atualização" de Deus, como quando Deus acrescenta o seu próprio trabalho ao trabalho das criaturas para fazer acontecer atos que as criaturas sozinhas nunca teriam feito.

Recentemente, cristãos de todo o mundo celebraram a Páscoa, um ponto alto na vida da igreja por causa do que Deus realizou no Calvário na morte de Jesus e em Sua ressurreição. O que celebramos na Páscoa, eu sugiro, são eventos que implicam fraca atualização por Deus da crucificação do justo Filho de Deus, a fim de que ele pudesse alcançar o grande bem da vitória sobre o maligno e a salvação de muitas pessoas presas em cativeiro. 

Pecado muito grave foi cometido ao se colocar Jesus à morte, mas foi a intenção de Deus que isso viesse a acontecer. No entanto, Deus não tem que agir de uma maneira pessoal e deliberada para realizá-la. Havia muitas pessoas preparadas para servir aos propósitos do arqui-inimigo de Deus, Satanás, um vez que este entrou em Judas (Lc 22:03; Jo 13, 2, 27) e trabalhou por meio dos líderes religiosos, cuja proteção de suas próprias posições os cegaram para a obra que Deus estava fazendo em trazer Seu reino, pessoas a quem Jesus chamou de filhos do diabo (Jo 8:44). Mas Deus tinha escolhido atualizar o mundo no qual essas pessoas cometeram estes males, porque por esses meios Deus trouxe redenção para a humanidade pecadora, um bem maior do que qualquer um que pode ser imaginado pelas criaturas de Deus.

Nota do blog:  A permissão divina que Terrance diz ser a visão "calvinista" só pode ser chamada dessa forma como se referindo a calvinismo num sentido estreito, isto é, a específica posição de João Calvino sobre o assunto.  Não podemos chamá-la de calvinista no sentido de "posição reformada" porque, embora seja a corrente principal atualmente, e a desse blogueiro, no passado vários reformadores não sustentavam a posição de Calvino, conhecida como permissão divina eficaz, e adotavam a que é chamada simplesmente de permissão divina, que é considerada hoje a posição arminiana.  

Tradução: Emerson Campos Pinheiro

Fontes:

Parte 1: http://thoughtstheological.com/the-contribution-of-hypothetical-knowledge-calvinism-to-our-understanding-of-evil-in-the-world-chosen-by-the-almighty-and-perfectly-good-god/

Parte 2: http://thoughtstheological.com/god-weakly-actualizes-evil/

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