sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Richard Muller: Universalismo Hipotético¹

O texto a seguir é uma revisão por Richard Muller do livro “English Hypothetical Universalism: John Preston and the Softening of Reformed Theology” de Jonathan Moore.

Muller:

Este volume oferece uma exposição detalhada e bem argumentada da visão da redenção expressa por John Preston, tanto em seus vários escritos quanto em seus depoimentos na Conferência York em 1626. Onde Moore claramente avança na discussão tanto da Conferência York em si quanto da teologia britânica do século XVII é em sua clara identificação do ensino de Preston, juntamente com o de vários contemporâneos mais importantes (notadamente John Davenant e James Ussher), como uma forma de universalismo hipotético, ou seja, a doutrina de que Cristo morreu pelos pecados da raça humana de forma que, se todos cressem, todos seriam salvos.


O que Moore demonstra muito bem é que o lado reformado do debate foi muito variado, incluindo universalistas hipotéticos bem como aqueles que negavam a redenção universal, e que a análise prévia dos debates teológicos do início do século XVII na Inglaterra, de forma muito simplista, identificou as partes no debate ou como arminianos ou como calvinistas. Na verdade, Moore ressuscita uma questão reconhecida no século XVII por Davenant, Baxter, e outros, e observou, em referência à Assembléia de Westminster por Alexander Mitchell, que houve um universalismo hipotético nativo na teologia reformada britânica.

O estudo de Moore, entretanto, por todo o seu excelente trabalho sobre Preston e sobre a Conferência York, incorpora dois significativos problemas com relação a perspectiva e contexto dos materiais examinados. Em primeiro lugar, há uma linha sistemática fundamental no argumento do livro que leva a reivindicações que não carregam um exame minucioso com relação a interconexão de formulações doutrinárias específicas. Particularmente em sua revisão da doutrina de William Perkins, Moore afirma que o predestinacionismo supralapsariano de Perkins juntamente com o seu federalismo o "dirigiu" para a conclusão da redenção particular, ou seja, que a toda-suficiência de satisfação de Cristo não produz uma oferta hipotética de salvação para todas as pessoas .

No entanto, o particularismo não foi a característica exclusiva dos federalistas supralapsarianos. Há também uma clara formulação particularista sobre a satisfação de Cristo na obra do contemporâneo de Perkins, Gulielmus Bucanus, que tendia para uma doutrina de predestinação infralapsariana e não era federalista. Da mesma forma, um posterior pensador reformado e ortodoxo como Turretin, um infralapsariano convicto, embora partilhasse do esquema dos dois pactos, não era um teólogo federal, no sentido estrito do termo, mas ensinou uma doutrina claramente particularista da satisfação de Cristo. 

Moore também subestimou a presença de não-amyraldianos ou formas não-especulativas do universalismo hipotético na tradição reformada como um todo e, assim, na opinião deste resenhista, interpreta mal a posição de Preston como um "abrandamento" da teologia reformada, ao invés de como uma continuação de uma trajetória do pensamento reformado que esteve presente a partir do século XVI. Claras declarações de universalismo hipotético não-especulativo podem ser encontradas (como Davenant reconheceu) em “Decades” e no comentário sobre o Apocalipse de Heinrich Bullinger, no “Loci communes” de Wolfgang Musculus, nas “catechetical lectures” de Ursinus, no “Tractatus de praedestinatione sanctorum” de Zanchi, dentre outros lugares.

Além disso, os Cânones de Dort, ao afirmar a distinção padrão de uma suficiência da morte de Cristo para todos e sua eficiência para os eleitos, na verdade, absteve-se de canonizar tanto a forma inicial de universalismo hipotético quanto a suposição de que a suficiência de Cristo serve apenas para deixar os não eleitos sem desculpa. Apesar de Moore poder citar as declarações da conferência York de que Dort "ou abertamente ou veladamente negou a universalidade da redenção do homem" (156), permanece o fato de que vários dos signatários dos Cânones eram universalistas hipotéticos - não apenas a delegação inglesa (Carleton, Davenant , Ward, Goad, e Hall), mas também [sic] alguns dos delegados de Bremen e Nassau (Martinius, Crocius e Alsted)- e que Carleton e os outros delegados continuaram a afirmar os pontos doutrinais de Dort enquanto se distanciavam da disciplina da igreja da Confissão Belga, e que no decorrer do debate do século XVII até os amyraldianos eram capazes de argumentar que o seu ensino não era contrário aos Cânones. Em outras palavras, a não-especulativa, forma não-amyraldiana do universalismo hipotético não foi algo novo vindo décadas depois de Dort nem foi um "abrandamento" da tradição. As posições de Davenant, Ussher, e Preston seguiam de uma residente trajetória longa reconhecida como ortodoxa entre Reformada. 

Em suma, este é um estudo significativo da teologia de John Preston e da importância de uma forma de universalismo hipotético na teologia reformada puritana e inglesa do início do século XVII, mas as suas conclusões precisam ser estabelecidas dentro e um pouco temperadas pela compreensão do contexto mais amplo e dos múltiplos fluxos de teologia na tradição reformada.

“English Hypothetical Universalism: John Preston and the Softening of Reformed Theology,” by Jonathan D. Moore. Reviewed by Richard A Muller, Calvin Theological Journal, 43 (2008), 149-150.

Nota do blog:

1. Título modificado

Fonte:  http://calvinandcalvinism.com/?p=284

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